In your face, parte 2: Os soldados - Uma batalha láctea de Starcraft
Originalmente publicado em 2014-04-13 23:25 no blog Patinete a vela.
Esta é a segunda parte da narrativa de uma batalha pouco digna em um planeta insignificante onde a vida humana pouco vale. E nem se fale da vida zerg… Não deixe de ler a primeira parte, clicando aqui.
In Your Face, Parte 2: Os soldados
Scott entrou na sala de instrução e procurou algum lugar para sentar. Havia uns quinze outros soldados na sala, alguns deles conhecidos, membros de sua própria patrulha, mas havia alguns outros que ele nunca tinha visto antes.
Scott sentou-se ao lado de seu amigo Franklin e perguntou o que ele havia perdido.
– Você não perdeu nada ainda. O sargento acabou de chegar com esse nerd aí na frente e estão há meia hora tentando fazer o projetor funcionar com o notebook.
Scott não conseguiu esconder sua preocupação.
– Cê viu como o quartel está perto das bases inimigas? – Nunca vi algo assim. O General não dá a mínima para nossas vidas, ele fica brincando com a gente e arriscando nossas vidas como se fossemos seus soldadinhos de brinquedo. – Dizem que ele é o general com o maior número de vitórias da Frota Imperial. – Também dizem que tem o maior número de derrotas. – Espero que ele tenha aprendido com seus erros pelo menos!
A conversa foi interrompida pelo sargento, que chamou a atenção dos soldados presentes. O rapaz que estava com ele usava um estereotípico avental de cientista e celebrava o fato de ter acabado de conseguir conectar seu computador ao projetor. Enquanto o sargento falava o cientista abria os slides que ele iria apresentar.
– Soldados, hoje vamos aplicar uma estratégia diferente do que vocês estão acostumados. O General tem aplicado esta estratégia em vários combates e ela tem sido bem sucedida. Na maior parte das vezes. Muitas vezes.
Um dos soldados levantou a mão:
– Sargento, esta estratégia tem a ver com o fato de termos uma incubadora zerg enorme bem no nosso quintal?
Os soldados pararam de conversar entre si e começaram a prestar atenção. O sargento continuou.
– Tenho aqui comigo o doutor Watanabe que irá nos explicar alguns fatos que vocês devem entender para realizar a missão que irão receber. Doutor, passo para o senhor a palavra. – Obrigado sargento. Respondendo à pergunta do soldado, sim, a incubadora faz parte da operação “Escudo Zerg”, que vocês estarão encarregados de executar.
O doutor Watanabe fez um gesto com sua mão e o sargento pressionou um botão do computador. Na parede foi projetado um fundo branco e uma foto de uma incubadora apareceu girando e estabilizou no meio da tela. Um típico efeitinho especial tosco de quem acabou de aprender a usar o recurso de animações do PowerOverwhelmingPoint. Sobre a foto apareceu o texto “Operação Escudo Zerg”, deslizando pela esquerda e fazendo o barulhinho de um zergnídeo. O doutor Watanabe sorriu, satisfeito.
– A incubadora zerg que todos vocês já devem ter percebido foi plantada por nós alguns dias atrás, antes da central de comando ter pousado neste planeta.
Franklin sussurrou para o Scott:
– Cacete, em poucos dias já cresceu tudo isso? – Shhh calaboca presta atenção!
O doutor Watanabe continuou:
– Quando plantamos a incubadora, esta começou um ciclo natural de evolução. Já começou a produção de zangões e em breve iremos pulverizar sobre ela uma substância que irá estimular a produção de uma rainha.
Franklin sussurrou de novo:
– Uma rainha zerg? Os caras estão insanos???
O doutor Watanabe fez um gesto novamente para o sargento, que passou para o próximo slide. Uma foto de uma rainha zerg apareceu.
– Normalmente as rainhas possuem uma ligação psíquica com o enxame, o que faz com que o enxame inteiro funcione como se fosse uma enorme consciência coletiva. Nós descobrimos, no entanto, que esta ligação psíquica é muito fraca no início da evolução da incubadora. Isto em geral permite que a rainha se preocupe inicialmente de forma independente apenas com o crescimento de sua incubadora. Quando a incubadora passa por alguns ciclos de amadurecimento, o elo psíquico fica mais forte e a rainha passa a poder receber ordens do enxame. Por enquanto a ligação ainda está fraca o suficiente para que nós consigamos bloqueá-la artificialmente.
O sargento apertou um botão do computador e apareceu uma outra foto. Era uma montagem da mesma rainha, em que ela aparecia usando um pequeno e bonitinho capacete feito de papel alumínio.
– Quando a incubadora ainda está jovem, a preocupação da rainha é de estimular a produção de zangões. Assim que o número de zangões for suficiente, ela começa a estimular a produção de zergnídeos. A rainha sabe que o número correto de zangões foi atingido porque ela sente um odor emanado por eles. Quando o odor for intenso o suficiente, ela pulveriza um hormônio especial sobre a incubadora que estimulará a produção de zergnídeos.
A imagem projetada mostrava agora uma incubadora com vários zangões. A rainha estava em uma pose obscena secretando uma substância sobre a incubadora.
– Nós conseguimos extrair de zangões que foram capturados vivos as glândulas que secretam o cheiro, por isso podemos pulverizar esse odor e enganar a rainha para forçar a produção de zergnídeos mais cedo do que o normal.
Franklin sussurrou:
– Droga, odeio zergnídeos.
O doutor Watanabe parecia estar cada vez mais empolgado com sua explicação.
– Uma vez que os zergnídeos forem produzidos, eles serão enviados pela rainha para atacar qualquer coisa que seja vista como ameaça para a incubadora.
O sargento tomou a palavra empolgado.
– E é nesse momento que vocês irão atrás dos zergnídeos. Os nossos inimigos não esperarão um ataque sincronizado de forças terranas e zergs, por isso contamos com que, no pânico, eles ataquem primeiro os zergnídeos. Viram só? É por isso que a operação se chama “Escudo Zerg”! Os zergnídeos agem como escudo! Um escudo de carne! Brilhante!
O mesmo soldado que levantara a mão antes perguntou:
– Sargento, e como os zergnídeos vão saber que nós não somos uma ameaça para a incubadora?
O doutor Watanabe tomou a palavra novamente.
– Nosso grupo descobriu recentemente que quando o elo psíquico com o enxame não está ativo os zergs recaem em um comportamento padrão instintivo. Este instinto respeita uma escala hierárquica e os indivídos que estão nos degraus mais baixos desta escala não se metem com os indivíduos mais altos. Os zergnídeos estão lá embaixo, acima apenas dos zangões. Acima dos zergnídeos estão as baratas, as hidraliscas, e assim por diante. E no topo da escala estão os mammuthus.
Um silêncio sepulcral pairou sobre o ambiente quando a enorme criatura zerg foi citada.
– Vamos enganar os zergnídeos pulverizando sobre suas armaduras de combate uma mistura que possui o odor que os mammuthus usam para marcar território. Testes sugerem que os zergnídeos irão evitar contato com vocês enquanto estiverem com o odor.
Um soldado perguntou:
– E o que há nesta mistura?
Ao que o doutor Watanabe respondeu:
– Bom, eh, a mistura contém basicamente excrementos de mammuthus, misturados com algumas substâncias específicas para aumentar a sua viscosidade e permitir que fique grudada na armadura por mais tempo.
– Cê tá dizendo que cês vão banhar a gente com merda de mammuthus?
Alguns soldados começaram a dar risada enquanto outros xingavam irritados. Franklin comentou com Scott:
– Hahahaha o pobre coitado que precisa recolher a bosta do mammuthus realmente tem o pior trabalho do universo…
O sargento tomou a palavra novamente.
– Esta operação depende de nós atacarmos rápido antes que nossos inimigos tenham chance de se defenderem. Estamos com dois quartéis avançados e iremos liberar soldados continuamente até formarmos um grupo grande o suficiente para atacar. Vamos atacar o exército que os zergnídeos atacarem primeiro. Enquanto os soldados inimigos desperdiçam munição matando os nossos “amiguinhos”, quero que vocês os matem, procurem invadir a base e inutilizem o maior número possível de VCEs. Assim que tiverem feito isto vamos atacar a outra base e a missão estará encerrada.
O sargento terminou seu discurso e olhou em volta. Todos os soldados olhavam atentamente para ele.
– Agora vão colocar suas armaduras de combate. Como a atmosfera deste planeta é respirável, desativamos a câmara de descompressão e a adaptadamos com borrifadores que irão borrifar o coquetel de mammuthus sobre suas armaduras. Dispensados.
Com isto o sargento virou-se para ajudar o doutor Watanabe a desmontar seu computador e o projetor. Os soldados se levantaram aos poucos e foram abandonando a sala de instruções em direção à câmara de equipagem, onde com a ajuda de robôs vestiriam suas armaduras e receberiam seus armamentos.
Quando Franklin chegou à sala de equipagem, quatro soldados já estavam com suas armaduras de combate e faziam fila na porta da sala de descompressão, enquanto outros quatro estavam imóveis sobre as plataformas onde braços robóticos montavam sobre seus corpos suas armaduras. Os demais soldados aguardavam seus turnos sentados em bancos e conversando. À medida em que cada soldado entrava na sala de descompressão, um rapaz entregava a cada um deles um saquinho amarelo que estava em uma pequena cesta de vime que ele carregava sob o braço. Franklin perguntou para o rapaz:
– Hein Harold, que porcaria é essa que você está entregando para os caras?
– Ah, Franklin, é uma bolsinha aromática à base de especiarias e perfume de alguns cactos ligeiramente venenosos daqui da região. É para que vocês coloquem na entrada de ar do sistema de ar condicionado da armadura para disfarçar um pouco o cheiro da mistura de mammuthus. Parece que o cheiro é terrívelmente forte.
– Vê dois para mim!
– Claro, pode pegar.
Franklin conversava com Scott quando, fazendo um enorme estardalhaço, Alex entrou na sala de equipagem. Ele já estava em sua armadura de combate.
– Ow, Alex, perdeu o briefing! O sargento não vai ficar muito feliz se te vir!
– Foda-se o sargento, eu tava lá no bar tomando umas com umas fantasmas gostosas. Aí perdi a hora, fui passar pela oficina para consertar meu ar condicionado mas o Dennis não estava lá. Agora minha armadura está um forno. Vou ficar com a minha viseira aberta.
– Excelente idéia! - exclamou Scott enquanto dava uma risadinha.
Mesmo quando não usava sua armadura, Alex não era um mero soldado – era do tamanho de um armário. Todos o respeitavam, ou talvez “temiam” seria uma palavra melhor, e ele se achava o tal e abusava de todo mundo sempre que sentia vontade. Por alguma razão ele gostava do Franklin, por isso eles conversavam frequentemente.
– Mas então, faz aí o resumo do que eu perdi – disse Alex.
– Basicamente vamos atacar as bases inimigas no meio de um monte de zergnídeos, rezando para não sermos atacados por eles enquanto absorvem o fogo adversário.
– Carne de zergnídeos fica boa com batatas. Chega de papo. Até.
Franklin olhou com estranheza após o comentário do Alex, enquanto este se dirigia ao portal que levava para a sala de descompressão. Lá Franklin viu Harold tentando dar uma bolsinha aromática para o Alex, até que este deu um tapão e mandou a cesta voando pela sala. Harold perdeu o equilíbrio e caiu no chão, enquanto Alex o mandava enfiar as bolsinhas naquele lugar e entrava na câmara de descompressão.
Scott olhou para o Franklin e mal conseguia conter o riso. Através do portal eles enxergaram Alex curioso parando no meio de um monte de braços mecânicos. De repente, ouviu-se pela sala inteira:
– Que merda é esta! Entrou na minha boca, aaaaargh!
Todos os soldados começaram a rir alto, mas era Harold que exibia o maior sorriso. Alex voltou da câmara de descompressão com a armadura e seu rosto cobertos de uma lama marrom-esverdeada grudenta. Ele estava furioso e atravessou rápido a sala de equipagem, resmungando.
Uma das plataformas de equipagem ficou livre nesse momento, e Franklin aproveitou a chance para pular em cima. Ele permaneceu imóvel enquanto o sistema de equipagem automatizado montava sua armadura de combate sobre seu corpo. Era um processo relativamente rápido, especialmente impressionante porque se tratava de uma armadura que pesava mais de 300 quilos. Os braços robóticos levantavam e posicionavam cada peça com grande rapidez e delicadeza. Finalmente, quanto o reator nuclear foi acoplado no dorso da armadura, Franklin ligou os sistemas e sentiu controle sobre o enorme monstro metálico.
Franklin posicionou as bolsinhas aromáticas sobre a entrada do ar-condicionado e caminhou em direção à câmara de descompressão. Quando passou por Harold, este avisou:
– Não esqueça de fechar a viseira!
Franklin sorriu, fechou sua viseira e entrou na câmara. Lá havia uma plataforma circular bem no meio da sala e quatro braços robóticos seguravam grossas mangueiras conectadas a quatro enormes tanques que transbordavam com o milk-shake de mammuthus. Franklin posicionou-se sobre a plataforma e sentiu quando os braços robóticos começaram a pulverizá-lo com a mistura. De fato, o fedor era insuportável e as bolsinhas aromáticas mal faziam efeito. “Espero que os zergnídeos achem o fedor tão terrível quanto eu estou achando”, pensou Franklin assim que descia da plataforma e saía da câmara de descompressão pelo lado oposto a aquele pelo qual ele entrou.
Na saída da câmara de descompressão havia uma escada rolante que levava os soldados até o nível do chão, onde ficava a saída do quartel. Havia outra escada rolante ao lado, mas esta precisava que um reator externo fosse instalado e, para esta missão em particular, parece que não haveria tempo de fazê-lo. Franklin dirigiu-se à escada e notou que o sargento estava lá esperando. Era um hábito dele ter umas ultimas palavras de encorajamento com os soldados antes de cada batalha. Enquanto Franklin entrava na escada rolante o sargento deu um tapinha no traseiro de sua armadura de batalha e disse:
– Boa sorte divirta-se!
Continua! Veja o desenrolar da batalha de uma perspectiva diferente na parte três.